Caros “Próximos”,
Permitam-me que vos trate assim, saltando o protocolo destas ocasiões.
Há 6 meses atrás, fomos ameaçados pelo Engº Ramalho Fontes que sairíamos daqui transformados e… mais pobres.
Condicionado pela minha formação base em engenharia mecânica, embora temperada por uma pós graduação em finanças, não foi difícil imaginar como tudo se passaria: um conjunto de sistemas e processos que nos puxam para o tapete do conhecimento, injectam finanças por um lado, marketing pelo outro, nos sacodem violentamente enquanto nos misturam técnicas de negociação e nos sacam o dinheiro dos bolsos.
No final da linha sairíamos com menos cash (caro Prof. Raul Diniz, como não sei latim, recorro ao inglês), mas com um bom stock de conhecimentos e por isso capazes de funcionar melhor. Tudo se passava ao nível do activo circulante e por tanto, não tinha impacto no balanço.
Mas afinal, não foi bem assim...
Nestes fantásticos 6 meses a máquina da AESE fez-nos interrogar íntima e profundamente, partilhar as nossas dúvidas e conclusões sobre cada caso, colocando-nos na dimensão única da “Pessoa”, preocupado com “o outro”, com “o próximo”.
Injectando conhecimentos qb, mas sobretudo puxando pelos ingredientes melhores que há em cada um de nós e transformando-nos de dentro para fora, em lume brando, numa meticulosa sucessão de casos em que ora queríamos despedir o Butler, ora o queríamos recontratar 5 casos mais adiante;
Nestes meses aprendemos tanto coisas sofisticadas, refiro-me evidentemente a finanças, cujos casos eram o terror dos grupos, como aprendemos coisas aparentemente triviais… aqui vão alguns exemplos: saber que nas administrações das organizações os problemas surgem “por rigorosa ordem de chegada!”, ou que, nas relações com os chefes, há que ter em conta “o critério da verdade suportável “… só se diz ao chefe o que ele consegue suportar, ou ainda, que a defesa dos factores críticos de sucesso é fundamental para assegurar a sobrevivência das empresas e que nesta altura, a obrigação dos conselhos de administração é “evitar la quiebra” (a falência) – na opinião do Prof Calleja, ou definir as regras operativas – na opinião da Professora Beatriz Muñoz-Seca
Também aprendemos coisas fundamentais: aprendemos que “é melhor sofrer uma injustiça, do que praticá-la, porque isso, pelo menos, não nos torna injustos”,
que “a propriedade tem uma hipoteca social”,
e que “a realidade é teimosa e não se deixa manipular”;
Aprendemos tudo isto vivendo um período histórico… de completo descalabro financeiro, económico e social, que colocou a nu a ausência de valores e em que todos nós, enquanto clientes, gestores, investidores, reguladores, governantes, etc, nos devemos questionar para corrigirmos trajectórias.
Percebemos que muitas vezes nos esquecemos de Ser (em maior ou menor dose), preocupando-nos talvez demasiado em Ter, e que é nossa obrigação enquanto líderes (e Pessoas), procurar evitar que isso volte a acontecer.
Tivemos a extraordinária oportunidade e o enorme privilégio, atrevo-me a dizer, que tivemos a Graça, de receber esta crise mergulhados neste ambiente de partilha e solidariedade, acompanhados por intelectuais de altíssimo nível que nos fizeram entender o essencial e nos deram a confiança necessária para a irmos superando, com esforço, mas determinados.
Para mim, pessoalmente, e penso que para a maioria dos meus colegas, este PADE já funcionou como um bálsamo para as feridas resultantes da crise e como um catalisador para as medidas que implementei nas minhas empresas.
Mas não quero falar de mim, porque não foi para isso que me elegeram.
Falando de configuração institucional, imediatamente após a eleição dos órgãos sociais deste 34º PADE, consultando as notas dos nossos professores de políticas empresariais Manuel Calleja e Agustin Avilez, criámos um comité e um sistema para apurar a opinião dos colegas sobre este 34º PADE.
Falta agora criar uma comissão reguladora para as actividades da presidência e vice-presidência.
Houve até quem aproveitasse para escrever “O caso do Presidente”, não quero referir nomes, mas foi aquele que fez a cobertura fotográfica da visita ao IESE.
Por falar em casos, recomendo vivamente ao Dr Pedro Ferro que avalie o excelente trabalho redigido pela Ana Trigo Morais sobre o Teatro Nacional de São Carlos, como contraponto ao Teatro Real. As diferenças são tão gritantes que é quase tão deprimente quanto a conferência do Prof. Vasconcelos e… (Sá).
Como se constata, o método do caso conquistou-nos ao ponto de queremos passar de leitores a redactores. O Prof. Raul Diniz dizia numa conferência recente, que quem sabe, faz, quem não sabe, ensina, e quem nem sabe ensinar, utiliza o método do caso.
Caro Prof Raul Diniz, qualquer conferência-colóquio ou qualquer caso nas suas mãos, é uma delícia que só lamentamos quando termina. Acredito que até este discurso nas suas mãos ganharia um brilho que mais ninguém lhe sabe dar.
Mas vamos às respostas do grupo ao tal inquérito:
À pergunta: Como te transformou este PADE, o que mudou de forma mais significativa na tua actuação profissional e pessoal?
Recebemos respostas em que se percebe a tirania e opressão em que viviam os nossos colaboradores. Vejam como nós éramos com estas caras de semana santa, mas com feitios de carnaval:
Dizem alguns: “Aprendi a ouvir os outros…”, só agora ???
Esta é mais subtil: “Sinto-me mais apto e preparado para introduzir novos ângulos de visão e considerar outras perspectivas nos meus processos de análise e decisão, seguro de que melhorarei a qualidade dos meus actos e o resultado da minha actuação como pessoa e profissional.”.
“Da minha parte, em todo o caso, digo-te em que é que o PADE mudou radicalmente a minha forma de actuar profissionalmente: obrigou-me a delegar mais na minha equipa e obrigou-me a forçar a minha equipa a sair da comodidade de me ter sempre ao pé, nos momentos em que é preciso decidir rapidamente…”
E continua: “… Alterou, por isso, a minha forma de delegar e de controlar. Além disso, o PADE tem a enorme virtude de nos obrigar a pensar sobre algumas coisas importantes (pessoal e profissionalmente) e de nos mostrar uma perspectiva completamente diferente dos problemas, transmitida por Colegas com outra vivência profissional e de outros sectores de actividade.”
Era pura centralização e tirania!.. afinal o impacto deste PADE já se fez sentir mais longe. Em nome de todos os colaboradores das empresas que dirigimos: obrigado AESE!
Quanto à 2ª pergunta: Quais foram as 3 coisas que aprendeste neste PADE que consideras mais relevantes para a tua vida profissional e pessoal?
Aqui ficam as respostas extraídas do caso: “o discurso de Presidente”, por serem representativas da maioria das opiniões e que mostram como éramos desequilibrados, superficiais e inconsistentes:
“O reequilíbrio das prioridades associadas aos valores que, não deixando de estar presentes, são por vezes subvertidos na rotina frenética do dia-a-dia.”
“Um aprofundamento de conhecimentos na área financeira, aumentando a percepção da sua relevância no contexto da minha actuação profissional.”
“Uma percepção muito mais consistente dos temas relacionados com configuração institucional, governo e direcção de negócios.”
Quanto à 3ª pergunta: Quais foram as 3 coisas e/ou momentos que não mais esquecerás?
As respostas não decepcionam e revelam a grande craveira intelectual deste grupo, “crème de la crème” da liderança empresarial do nosso país (Prof. Raul Diniz, cá está um pequeno toque de francês para aumentar o nível).
E as respostas foram:
“a prima do José Carlos ”
“a camisa do Carlos Brites em Madrid”
“os jantares dos colegas do norte”
“os pasteis de nata dos intervalos”
“os fabulosos almoços”
Mas apesar de menos inspiradas, também houve referências à enorme qualidade das reuniões de grupo, à viajem a Madrid e a como foram fantásticos aqueles 2 dias, ou à camaradagem de todo o grupo.
Fico-me por citações e não me atrevo a fazer uma estatística, por ter aprendido neste PADE que as estatísticas apenas servem para apoiar e não devem iluminar conclusões (a história do candeeiro).
Por outro lado, confesso-vos um recente trauma familiar: no outro dia, o meu enteado de 12 anos, procurando mostrar à mesa do jantar como eu falo (imitando o estilo e o conteúdo), pôs um ar empertigado e disse: “... sim porque 85% das vezes…” e desmanchando-se a rir, concluía: “… o tio passa a vida a falar em percentagens...”
50% do que ele disse, é um exagero!
Voltando aos temas sérios, concluímos que ao em vez de pretender transformar-nos simplesmente em melhores gestores, a AESE procurou transformar-nos em melhores líderes. Aprendemos aqui que os líderes podem crescer (embora ainda se discuta se nascem, ou se fazem) e que para isso acontecer, é fundamental que se transformem em melhores pessoas.
Esta transformação ocorreu nos anfiteatros, nas salas de trabalhos de grupo, nos restaurantes da AESE e do IESE, nas trocas de emails e a partir de certa altura, até mesmo nas nossas horas de estudo em que conseguíamos antecipar as reacções e os tiques dos outros.
A partir de certa altura, ocorreu enquanto estávamos nas nossas empresas e nas nossas casas, no dia-a-dia indissociável do que somos.
Durante este período de tempo, experimentámos: ser o próximo e amar o próximo, através do interesse nos outros, da entreajuda, do reforço da capacidade para ouvir, e gostámos tanto, que ainda mal acabámos o PADE mas já estamos com saudades deste tempo. Não vos faz recordar a história das 3 tendas no cimo do monte Tabor?…
Sentimo-nos “o próximo” dos nossos professores, dos colaboradores da AESE, do IESE, de todos os familiares e muito especialmente, dos colegas.
Terminámos hoje o 34º PADE e vamos seguir os nossos caminhos realmente transformados, tal como nos prometiam no início do programa.
Por esta transformação, queremos agradecer aos professores e a todos os colaboradores da AESE, mesmo àqueles que não nunca vimos mas cujo trabalho sentimos, pela dedicação e carinho que permitiram que chegássemos a este dia com o sentimento pleno de “valeu bem a pena!”
Um agradecimento sentido aos professores do IESE, pelas constantes deslocações e canseiras, nunca demonstradas nas muitas horas que passámos juntos, sempre bem-dispostas e de grande valor.
Não mais nos esqueceremos da importância da “configuraçào institucional!” ou do “papá pan, papá pan” com que éramos chamados a pensar nas motivações dos intervenientes nos casos.
Agradecemos muito especialmente às nossas famílias, elas que foram as grandes sacrificadas com a nossa participação no PADE (podem-se beijar em agradecimento…) , não que em alguns casos não tenham ficado intimamente satisfeitas com a nossa indisponibilidade, mas pelo menos perdoem-nos por todas as obrigações familiares que deixámos de cumprir. O Dr Pedro Ferro foi o único responsável, aquela história das 10 h de estudo por semana, foi publicidade enganosa.
Pedem-me os meus colegas que nesta altura ensine o conceito de sunk cost aos familiares presentes, não vão alguns tentar recuperar os custos familiares.
Agradecemos aos nossos colegas do 33º PADE que nos iluminaram no arranque e nos deram o primeiro empurrão para os trabalhos em grupo.
Terminamos este programa com uma renovada perspectiva cristã das nossas vidas profissionais, mais conciliados com as nossas fragilidades e dualidades, mais conscientes de que, tal como os conhecimentos se adquirem, também os valores se constroem e corrigem.
Caro Engº Ramalho Fontes, a sua ameaça falhou a 50%! De facto, estamos transformados e muito mais ricos … mesmo !!! Refiro-me aos capitais próprios que aumentaram efectivamente, e não a um qualquer discount cash flow actualizado sabe-se lá com que taxa...
E agora: “Alea jacta est!” (caro Prof. Raul Diniz, momento alto, cá está o latim)
Sabemos agora que ainda temos hipóteses de sermos melhores gestores, melhores pessoas e como tal, melhores líderes.
Podemos contar uns com os outros para continuarmos os nossos caminhos, sabemos que não estamos sozinhos porque agora somos “próximos”.
A Ana Isabel e eu, daremos o nosso melhor para manter a coesão do grupo e a proximidade à AESE, mas sobre isto falará a Ana.
A todos, muitas felicidades e muito obrigado.
Parafraseando o Dr Pedro Ferro, se acharem bem … agora eu calo-me.
Lisboa, 21 de Abril de 2009
João Virott da Costa
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.